"PORQUE ONDE ESTIVER O TEU TESOURO, ALI ESTARÁ O TEU CORAÇÃO". Mt 6,21

segunda-feira, 26 de abril de 2010

O interesse do público despertado por questões de índole transcendental... "A Viagem e o Além-Aquém"

O texto abaixo se refere a telenovela brasileira “A Viagem”, produzida pela Rede Tupi e exibida de 1 de outubro de 1975 a 27 de março de 1976, às 20 horas, em 141 capítulos. Escrita por Ivani Ribeiro, foi dirigida por Edson Braga e Atílio Riccó, com supervisão geral de Carlos Zara. (cf. Wikipédia)


Dom Estêvão, na Revista Pergunte e Responderemos, de maio de 1976, faz uma reflexão sobre o tema, que nos dias de hoje continua atual e é merecedor de reflexão.

O interesse do público tem sido despertado vivamente por questões de índole transcendental, como as que se relacionam com a vida póstuma. Muitos autores de novelas, filmes, tentam apresentar o Além... Como, porém? Como se fosse uma sucursal da terra: com ciúmes, preconceitos, angústias... É verdade que, para sondar o desconhecido, o homem tende a usar das suas habituais categorias de pensamento; concebe o invisível à semelhança das coisas visíveis. Essa tendência espontânea é corrigida por uma reflexão mais apurada sobre o assunto.

É justo, pois, que o cristão indague a si mesmo: como será a vida eterna?

Para responder à pergunta, a S. Escritura propõe algumas imagens: a vida eterna seria semelhante a uma festa nupcial com seu banquete solene (cf. Mt 22,1-14); seria o paraíso (cf. Lc 23,44), concebido talvez como lugar ameno; seria “o seio de Abraão” ou a grande reunião de família (cf. Lc 16,22). Isto tudo são símbolos que, através de roupagem sensível, significam bem-estar, plenitude, ventura... Sugerem a ideia de localização, ambiente feérico e espetáculo...
Ora, se de um lado, a vida eterna será a saciedade de nossas aspirações mais genuínas, ela, de outro lado, nada terá de topográfico e teatral. Não se poderia, pois, concebê-la em termos mais precisos e menos antropomórficos¹? - Sim. A fé ensina que a vida eterna será o encontro com Deus, sem véus nem mistérios.Nós o veremos como Ele é! (1Jo 3,2). Não se julgue, porém, que Deu aparecerá frente ao homem como talvez tenha acontecido em histórias de teofanias. Deus não é um estranho ao homem, nem é um “amigo oculto”, nem um Grande Rei em cujos aposentos nós penetraremos. S. Agostinho diz muito sabiamente que “Deus é mais elevado do que o que tenho de mais elevado, e me é mais íntimo do que o que tenho de mais íntimo”.
O cristão participa da vida do próprio Deus, como “consorte da natureza divina” (2Pd 1,4). Isto não quer dizer que uma parcela de Deus esteja dentro do homem (Deus não tem partes), mas, sim, que a graça santificante habilita o homem a conhecer como Deus conhece e a amar como Deus ama. Donde se segue a vida eterna começa no tempo; não é simplesmente algo de vindouro, que o cristão deva esperar, mas é algo de que desfruta já na vida presente. Em consequencia, se alguém quer ter uma noção aproximada (pálida, mas autêntica) do que seja a vida eterna, aplique o seguinte critério, que é de todos o mais direto e fiel: pergunte a si mesmo: “Que é Deus para mim? Que lugar ocupa Ele em minha vida: Em que medida encontro nele a minha resposta?”

Via de regra, um cristão dirá: “Deus é tudo para mim”, fazendo eco talvez à célebre exclamação: “Meu Deus e meu tudo!” Note-se, porém, que é fácil dizer isto enquanto temos o subsídio das criaturas sensíveis: parentes, amigos, saúde, suficiência material... Estas são “muletas” com o apoio das quais nos sustentamos diante de Deus e dizemos “Deus é tudo para mim!” Talvez seja um tanto ilusório dizer isto enquanto me vejo apoiado em tantas muletas.
Pergunte, porém, cada um a si mesmo: “Estaria eu em condições de dizer que Deus é tudo para mim, ainda que não tivesse tais subsídios?” Estaria eu à vontade diante de Deus, encontrando nele a minha resposta, se eu me visse sobre um leito de dor, talvez esquecido por meus amigos e abandonado pelas criaturas? Até que ponto Deus hoje ou agora é a minha suficiência, Ele que, sem dúvida, deverá ser a minha suficiência por toda a eternidade? Já iniciei realmente a eternidade no tempo?
São estas indagações que o cristão deve enfrentar sinceramente quando considera a vida eterna. Não a procure à distância, mas encare-a dentro mesmo, e examine-se a respeito do que significa o “estar-com-Deus” na sua vida pessoal. Até que ponto me regozijo e sinto feliz ao lembrar-se de Deus, o Sumo Bem?
A atenção a estes dados será o termômetro mais seguro para que cada um avalie o seu crescimento interior e definitivo. Este não pode deixar de merecer o máximo da atenção de um cristão; os cristãos que o examinam, são “vivos, eficazes e mais penetrantes do que qualquer espada de dois gumes, chegando a dividir alma e espírito, junturas e medulas” (Hb 4,12).
Olhando para a Virgem-Mãe, o cristão se reconforta para prosseguir na tarefa de construir a si mesmo e construir um mundo melhor.
¹Antropomorfismo é uma forma de pensamento que atribui características ou aspectos humanos a Deus, deuses, elementos da natureza, animais e constituintes da realidade em geral. Nesse sentido, toda a mitologia grega, por exemplo, é antropomórfica. (cf. Wikipédia)

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