Nos arredores daquela vila, um lobo que a fome ainda tornara mais voraz, além de devorar cordeiros e ovelhas, não poupava nem mesmo as pessoas que tivessem a desgraça de encontrá-lo.
Reinava a consternação em todo o povoado, porquanto ninguém mais poderia se aventurar de sair só ou desarmado, sendo proibido às senhoras e crianças até de pisar fora de casa.
Informado disto o amorável Francisco, apiedou-se daquela pobre gente. Viajou para Gubbio, e, invocando a ajuda do Céu, dirigiu-se para o lugar onde vagava o lobo. Muita gente o seguia a prudente distância.
Mal o avistou, o lobo lançou-se-lhe em direção, ululando e rangendo os dentes, de maneira arrepiante. O santo traçou no ar o bendito sinal da Cruz e disse:
- Eu te ordeno, em nome de Deus, que não faças mal, nem a mim e nem aos demais!

Irmão lobo – ajuntou o homem de Deus – fizeste muita bandalheira por esta região, e, conforme estou informado, até mortes! Não mataste apenas brutos, senão também homens, que são feitos à imagem e semelhança de Deus! Infundes o terror, e os homens, com muita justiça, são teus inimigos e te querem matar. Tu, porém, não mates mais a ninguém, nem pratiques outros danos, que eu, em nome do Senhor, farei retornar a paz entre ti e eles.
O lobo concordava abaixando a cabeça e abanando a cola.
- Eu sei – prosseguiu o Santo – que praticaste aqueles prejuízos por culpa da fome. Doravante, porém, tua fome será saciada, porquanto, os próprios cidadãos providenciaram por isto. Prometes, pois, não mais causar prejuízo algum nem a pessoas nem a animais?
O lobo prometeu fazendo sinal com a cabeça e a cauda. A seguir, à maneira de manso cãozinho, acompanhou o Santo até a praça da vila, por entre o estupor e a comoção gerais. Ninguém mais reconhecia nele a fera, e Francisco lhe disse:
- Irmão lobo, dá-me uma garantia de tua promessa! E o lobo levantou uma pata, pondo-a sobre a mão de Francisco, que se valeu da oportunidade para pregar ao povo:
- Irmãos, não vivais mais em pecado; caso contrário, merecereis o castigo de Deus. O inferno é muito mais terrível do que a ferocidade de um lobo! Confessai os vossos pecados e pedi a Deus o seu perdão, que Ele saberá livrar-vos do fogo do inferno, da mesma forma como hoje vos libertou desta fera. Irmão lobo não mais será feroz e saberá manter a sua promessa. Mantende vós também a vossa, e vos podereis aproximar dele sem receio.
Desde aquele dia, o lobo passeava tranquilamente pelas ruas da vila, qual bom irmão penitente, esmolando sua comida. Entrava pelas casas como qualquer cãozinho na de seu legítimo dono, e não raro era chamado até a comer. Deixava-se acariciar, e não faltavam à sua volta inocentes crianças, satisfeitas de sua amizade, como pessoas adultas que se não cansavam de admirar, considerando a infinita bondade do Criador.
Dois anos mais tarde, o lobo morreu de velho, todos ficaram sentidos com seu desaparecimento. É que já era para todos como um vivo testemunho da santidade de Francisco e uma prova palpável de que a fraterna bondade, sendo capaz de amansar as próprias feras, não pode deixar de ser suficiente para abrandar o coração empedernido do mais perverso dos homens.
Oh, se o mundo se inspirasse na bondade franciscana, filha primogênita da caridade de Cristo!
Em Gubbio, se pode admirar um minúsculo mausoléu – sepultura do lobo que, por virtude do Santo, ainda hoje é recordado pela História.
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