"PORQUE ONDE ESTIVER O TEU TESOURO, ALI ESTARÁ O TEU CORAÇÃO". Mt 6,21

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Aprendei a fazer o bem...

Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo Metropolitano de Belo Horizonte

O bem sempre triunfa. Esta é uma convicção ética testemunhada e cultivada pelo coração dos que apostam na bondade. Ela é que mantém e sustenta os justos e bons no caminho e na prática do bem. Até mesmo quando as provas e evidências não apontam nesta direção e nem justificam sua adoção. Mais difícil é nutrir esta convicção quando se contabiliza o crescimento do mal no mundo, os prejuízos que atingem frontalmente os pobres e indefesos. É triste verificar o mal praticado como hábito e como gosto prazeroso. É a morbidez da maldade como prazer tomando conta dos corações. Ainda mais triste é saber e conviver com tantos corações, disfarçados em rostos falsamente angélicos, que se alimentam de cálculos maliciosos e ardilosos para justificar e manter suas posições, vantagens e interesses. Esta aposta no bem desarma os impulsos do revide e invalida as lógicas da vingança. Vale, então, ecoar diuturnamente nos corações a força ética deste categórico convite: Aprendei a fazer o bem.
Esta é a prática pedagógica dos profetas tentando arrancar o seu povo do lamaçal de maldades. Bater nesta tecla é um mecanismo que configura horizontes de escolha e cria convicções. Trata-se mesmo de uma aprendizagem. Uma aprendizagem que deve se tornar exercício diário e contar com ambientes e dinâmicas de convivência que facilitem sua experiência. Aprende-se a fazer o bem fazendo o bem. Não é um simples ensino. É um processo de apropriação que se verifica na medida em que cada qual pratica o bem. É assim que pai e mãe edificam a matriz desta convicção ética no coração dos seus filhos. É na medida em que se apropria desta matriz e se cultiva sua dinâmica que o coração humano cresce na sedução por fazer o bem e se demove da tendência funesta da prática do mal. Não vale a pena colaborar no acervo destrutivo que mantém a vida pessoal e social refém da maldade e de tudo o que esvazia as próprias riquezas conquistadas e construídas pelo engenho da inteligência humana, e alimentadas pelo amor do coração.
O bem é uma questão de amor. O amor não é uma simples questão de gosto e de impulso. O amor é também, primordialmente, uma questão de fé. Por ser questão de fé é experiência. Sendo experiência se alavanca e se impulsiona pela força de princípios. Os princípios não são originários do si mesmo de cada um. Isto é, cada qual não é aquele que determina e se constitui em ponto de partida, na qualidade de princípio, para as práticas da vida. Esta é a direção que gera e multiplica as delinqüências e nutre deterioração dos vínculos, incapacitando para relacionamentos autênticos e transformadores. O princípio do amor é Deus. O evangelista João recorda que ‘Deus amou tanto o mundo que deu o seu filho unigênito, para que não morra todo aquele que nele crer, mas tenha a vida eterna’ (Jo 3,16). Deus, portanto, é o princípio do amor. O amor de Deus é qualificado pelo gesto único da oferta do seu próprio filho, para além de toda lógica e expectativa, e pelo fato de amar primeiro. A qualificação do amor recebida de Deus, seu princípio primeiro e insubstituível, configura o amor verdadeiro como oferta permanente para salvar e redimir. Só ama de verdade quem compreende e emoldura todos os seus gestos e palavras na atitude corajosa de fazer ofertas para o bem.
Enquanto houver necessidades e carências o amor verdadeiro não se cansa de fazer ofertas. Esta qualificação do amor, advinda da qualidade completa do amor de Deus que se oferece, abriga também e particularmente a desafiadora característica de amar primeiro. Deus é quem ama primeiro. Em razão de amar primeiro, todo amor verdadeiro se prova pelo gesto de também amar primeiro. Este princípio jamais permitirá a vingança, o ódio ou o revide. Nada justificará qualquer atitude que venha em prejuízo do outro, porque Deus amou primeiro, e quem ama no amor de Deus sempre ama primeiro. A vivência deste princípio modulará o coração na capacidade de perdoar e de reconciliar-se, compreendendo a vida como cenário da prática e da vivência do bem. Jamais uma palavra, nem gestos que alimentem discórdias, guerras ou comprometimento da fraternidade universal.
O bem nasce e se mantém pela fidelidade ao princípio de amar primeiro e caracterizar o amor como oferta. Oferta de perdão para refazer vínculos; oferta de oportunidades para superar preconceitos e exclusões; oferta de bens, como partilha solidária, para vencer as carências que na ordem social revelam a inverdade do amor proclamado e cantado pelos corações. A prática do bem se torna a opção da vida. A opção de aproximar-se de Jesus Cristo, ‘a luz que veio ao mundo’. Não preferir esta luz e não praticar a adesão a ela é admitir as próprias ações como más.
“Quem pratica o mal odeia a luz e não se aproxima da luz para que suas ações não sejam denunciadas. Mas quem age conforme a verdade aproxima-se da luz para que se manifeste que suas ações são realizadas em Deus” (Jo 3,20-21) Deus é amor.

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