"PORQUE ONDE ESTIVER O TEU TESOURO, ALI ESTARÁ O TEU CORAÇÃO". Mt 6,21

domingo, 15 de maio de 2011

Maria, Virgem Mãe - 1.2. No parto - continuação

1.2. No parto 

1. Alguns teólogos julgam poder depreender a virgindade no parto diretamente do Evangelho. Com efeito, o texto de Jo 1,12s, além da forma comumente aceita, apresenta a seguinte variante nos manuscritos gregos:

“A todos os que O receberam,
Deu o poder de se tornarem filhos de Deus,
Aos que creem em seu nome,
Ele (o Verbo) que não nasceu do sangue,
Nem da vontade da carne,
Nem da vontade do homem,
Mas nasceu de Deus”.

É preciso, porém, reconhecer que tal maneira de ler o texto joaneu carece de fundamento nos melhores manuscritos; por isto não é fidedigna.

Os teólogos citam também o texto de Lc 2,7: “Maria gerou seu filho primogênito, envolveu-o em panos e deitou-o no presépio”. Tais dizeres insinuam a ausência das dores e da prostração que costumam acompanhar todo parto. A Tradição, aliás, repetiu frequentemente que Maria “deu à luz sem dor” (peperit sine dolore), intencionando assim professar a maternidade virginal de Maria. Todavia não se poderia insistir sobre a necessidade de parto indolor para se resguardar a virgindade de Maria.
Ainda com referência à S. Escritura objetam alguns estudiosos:

S. Lucas (2,23) aplica a Jesus o texto de Ex 13,2.12.15, texto conforme o qual Cristo seria “o filho que abre o seio materno”... – A esta dificuldade responde-se: “filho que abre o seio materno” é expressão clássica da Lei de Moisés para designar o primeiro (ou também... o único) filho. Tais palavras não têm em mira um fenômeno, mas apenas a posição jurídica do filho na família. Donde se vê que a passagem de Lc 2,23 não afeta o nascimento virginal de Jesus.
Eis quanto se pode colher na S. Escritura com referência à virgindade de Maria no parto. Será preciso reconhecer que os citados textos, por si mesmos, não bastariam para fundamentar o artigo de fé.

2. A virgindade de Maria no parto foi especialmente enfatizada por uma seita de hereges dos dois primeiros séculos: os docetas. Afirmavam que o Senhor não tivera senão um corpo aparente; e, para dar verossimilhança à sua tese, compraziam-se em dizer que Jesus não nascera como os outros homens e que, consequentemente, Maria permanecera virgem!
À vista disto, alguns escritores cristãos do século III, como Tertuliano e Orígenes, negaram a virgindade de Maria no parto.

Passada, porém, a controvérsia docetista, prevaleceu claramente a crença da Igreja, a qual se afirmou em numerosos testemunhos. Destes sejam apenas dois citados:

S. Leão Magno, Papa (+ 461): “O Filho de Deus foi concebido do Espírito Santo no seio da Virgem Maria, que O deu à luz, conservando a sua virgindade (salva virginitate) como o concebeu conservando a sua virgindade (salva virginitate)” (ep. a Flaviano 2).

S. Gregório Magno, Papa (+ 604): “O corpo do Senhor, após a ressurreição, entrou onde se achavam os discípulos, passando por portas fechadas, esse mesmo corpo que, ao nascer, saiu do seio fechado, manifestando-se aos olhos dos homens. Não é para admirar que o Senhor, ressuscitado para viver eternamente, tenha atravessado portas fechadas, visto que, para morrer, Ele veio a nós através do seio fechado da Virgem” (Sobre os Evangelhos hom. 26,1).

3. A respeito da virgindade de Maria no parto alguns teólogos modernos tentaram recorrer à biologia a fim de a elucidar; seus escritos desceram a pormenores tais que provocaram uma intervenção do Santo Ofício. Com efeito; aos 27/07/60, a S. Congregação do S. Ofício dirigiu uma carta aos Superiores Gerais das Ordens e Congregações Religiosas, a fim de que os respectivos afiliados (teólogos, escritores, pregadores, confessores, etc) dela tomasse conhecimento e a observassem fielmente. Eis o teor dessa Declaração:

          “Suprema Sagrada Congregação do Santo Ofício
          Prot. N. 311/60/i

                                           Palácio do Santo Ofício, 27/7/1960
                  Revmo. Padre,

     Esta Suprema Sagrada Congregação teve que constatar repetidas vezes, com profunda preocupação, nestes últimos tempos que se publicam estudos teológicos nos quais a delicada questão da virgindade de Maria Santíssima no parto é tratada com deplorável crueza de expressão e, o que é mais grave, em aberta contradição com a doutrina tradicional da Igreja e com o piedoso sentir dos fieis.
       Na Congregação plenária de quarta-feira 20 do corrente, pareceu, pois, necessário aos Exmos. Padres do S. Ofício, em virtude da sua gravíssima responsabilidade de tutelar o depósito sagrado da doutrina católica, determinar que para o futuro seja vedada a publicação de semelhantes estudos sobre o problema em questão.
     Vossa Paternidade Revma. Queira providenciar no sentido de que seja escrupulosamente observado, por parte dos Religiosos dessa Ordem, tal decreto da Suprema Congregação.
     Na expectativa de uma cortês resposta, de bom grado me confirmo com sentimento do mais religioso apreço.

De Vossa Pat. Revma.
dedicadíssimo
P. Raimondo Verardo, O.P.
Com, rio”

Como se vê, este documento pede sobriedade e reserva diante da virgindade maternal de Maria, cujo caráter singular e transcendental há de ser preservado respeitosamente.

Dom Estêvão Bettencourt O.S.B. 
Diálogo Ecumênico

A seguir: Virgindade após o parto

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