"PORQUE ONDE ESTIVER O TEU TESOURO, ALI ESTARÁ O TEU CORAÇÃO". Mt 6,21

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Maria, Virgem Mãe - Virgindade após o parto - continuação


2. Dúvidas

Duas são as principais dificuldades que hoje em dia se propõem contra a tradicional crença cristã:
1)      “Os textos bíblicos que insinuam a virgindade de Maria, são peças poéticas... O Novo Testamento, em seu conjunto, dá a impressão de que o parto virginal é uma expressão metafórica que, significa ser Jesus o Filho Unigênito de Deus” (assim pensa Piet Schoonenberg, segundo “Herder Correspondence” may 1967, p. 158).
- Em resposta, dir-se-á: os textos do Novo Testamento, sugerindo o nascimento milagroso de Jesus neste mundo, talvez pudesse ser tidos como expressões de poesia. A poesia recorre, sim, frequentemente a figura e metáfora de sabor maravilhoso, as quais não hão de ser tomadas ao pé da letra.
Contudo não basta que um texto bíblico descreva portentos para que se afirme ser poesia, ou para que se lhe denegue genuíno valor histórico e se lhe atribua sentido metafórico. Como foi dito, a fé cristã admite que Deus faça milagres.
Os critérios autênticos para se julgar se determinada passagem bíblica há de ser entendida ou não ao pé da letra, são

o gênero literário da mesma e
a analogia da fé.

O gênero literário... Não há indícios de vocabulário ou estilo que obriguem o intérprete a se afastar do sentido literal das passagens do Novo Testamento concernentes à virgindade de Maria (Lc 1,34s; Mt 1,16.18-23). São passagens sóbrias em seus dizeres, destituídas dos pormenores numerosos e fantasistas que caracterizam as lendas. Diferem profundamente, por sua mentalidade, das tradições mitológicas dos antigos gregos, persas, babilônios... que falam de nascimento virginal de certo Ser Divino, acumulando prodígios e portentos de reverência perante o mistério da natividade de Jesus. Descrevem o nascimento e a infância de Cristo em cenas de elevado nível moral, ao passo que as narrativas poéticas das mitologias antigas propõem o amor erótico ou apaixonado dos deuses. – Ademais deve-se notar que tanto os judeus como os antigos cristãos faziam questão de guardar puras as suas crenças, preservando-as de qualquer contaminação paganizante; os cristãos foram perseguidos durante três séculos justamente porque não queriam tomar parte nas instituições de seu tempo que tivessem o mínimo sabor de paganismo. Sendo assim, não se entenderia que já na sua primeira geração tenham aceito dos pagãos um mito: o mito da “Virgem-Mãe”.

A analogia da fé. Os textos não podem ser interpretados independentemente da Tradição ora; ao contrário, o seu genuíno sentido só se patenteia quando colocados sob a luz dos dizeres teológicos dos escritores cristãos através dos séculos. A Tradição oral tem suas expressões particularmente abalizadas nos pronunciamentos do magistério oficial da Igreja. Ora é moralmente unânime o acordo da Tradição através de seus vinte séculos em relação à virgindade de Maria; esta é afirmada sem restrição, como algo que a Mãe de Deus nunca perdeu; de modo especial, a Liturgia sempre encareceu este privilégio mariano.

O leitor compreenderá que nestas páginas não é possível acumular citações além das que atrás apresentamos, a fim de corroborar os dizeres acima. Seja, porém, lícito reproduzir a última declaração do Magistério a propósito, isto é, os dizeres do Concílio do Vaticano II:

“A união da Mãe com o Filho na obra da Redenção manifesta-se desde o momento em que Jesus Cristo é concebido virginalmente até a sua morte:... no nascimento, quando a Mãe de Deus, cheia de alegria, mostrou aos pastores e aos magos o seu Filho primogênito, que não diminuiu, mas consagrou, a sua integridade virginal (Const. “Lumen Gentium” nº 57).

Objeta-se outrossim o seguinte:

2)      “Quem admite a virgindade perpétua de Maria, deprecia a maternidade. O ato de dar à luz segundo as circunstancias naturais da biologia não é pecaminoso. Por que então não o atribuir a Maria? Justamente em nossos dias, quando tanto se quer valorizar a santidade da vida conjugal, está fora de propósito dizer que Maria não foi mãe como as outras mães”.
- Por certo, a fé cristã refeita qualquer concepção dualista que apresente as funções da maternidade como algo de impuro ou indigno dos santos. A vida matrimonial é santa, desde que vivida segundo a vocação divina; São Paulo observa que a mulher se salva pela geração dos filhos (cf. 1Tm 2,15). O Concílio do Vaticano II empenhou-se por colocar tais verdades em plena luz, dissipando noções pejorativas que tenham outrora pairado sobre o matrimônio. Não se creia, pois, que a doutrina da virgindade de Maria se prende a uma concepção pejorativa de sexo e vida sexual; os atos de conceber e dar à luz dentro das leis da natureza nada têm que ofenda a Deus e redunde em desdouro dos genitores. – É muito importante frisar estes princípios.

Todavia a ênfase sobre a santidade conjugal não implica em derrogação à verdade enunciada por São Paulo (1Cor 7): a virgindade constitui um estado de vida muito valioso no contexto do Novo Testamento: significa que os cristãos compreenderam que já chegaram os valores definitivos e que o Reino de Deus já se iniciou com Cristo. Por isto o cristão tem interesse em se isentar, tanto quando possível, dos afazeres temporais para se entregar o mais possível aos bens eternos que irromperam no tempo. A virgindade é a vida uma, indivisa, que adere ao Esposo Divino sem intermediário; o símbolo desta adesão total a Cristo é a integridade física ou a virgindade corpórea. Ora foi certamente para dar pleno realce ao valor da vida virginal que Deus Pai quis conservar a virgindade de Maria. Também no séc. XX a proposição de 1Cor 7 conserva toda a sua autoridade.


Dom Estêvão Bettencourt O.S.B.
Diálogo Ecumênico

A seguir: Significado positivo

Nenhum comentário: